Emudecia cada vez que gritavam com ele...era sempre a mesma lengalenga...o dinheiro, a casa, os sogros, o gato, o chefe que não gostava dele...as responsabilidades...na verdade tudo era motivo para ela lhe arranjar uma discussão. E os filhos a ouvirem...
Tinha-se tornado um problema este casamento. Ela era um problema para ele e ele só lhe apetecia desaparecer da face da Terra ou arranjar coragem para a trair ou mesmo para lhe elevar a voz e responder à letra. Sim, estava cansado de não conseguir enfrentar o medo que tinha dela e dos seus acesso de fúria que nunca sabia como poderiam acabar...
No início, não tinha sido assim. Ela era fantástica, cheia de paciência e carinho. Mas, infelizmente os anos tinham passado e pouco a pouco, ela tinha-se tranformado, cogitava ele...Mas será que ela se tinha transformado ou será que tinha sido sempre assim e tinha apenas fingido nos primeiros tempos ser o que não era? Sabia, que nunca teria resposta a estas e tantas outras interrogações que o assolavam, dia após dia, noite após noite...
Qualquer dia, depois dos constantes insultos, só lhe faltava ela bater-lhe... Ouvia sempre falar da violência conjugal que as mulheres passavam, mas nunca tinha ouvido casos como o seu...
Sou um fraco, um cobarde, pensava para os seus botões sem conseguir ter força para acabar com este suplicío quotidiano.
Partir era o seu desejo, mas como deixar os filhos para trás? E levá-los e privá-los da mãe? Não seria capaz, pois bem sabia o que doía viver com pais separados, que se degladiavam lutando pelos filhos como forma de atingir o outro...e bem sabia como ela nunca o perdoaria por semelhante acto e como o faria pagar por uma humilhação destas...
Os anos passaram e ele envelheceu ali ao lado dela, aniquilando-se, em nome dos filhos que entretanto cresceram, sem respeito por ele e que estavam de partida. Estava feliz por eles, mas sentia-se profundamente sózinho, tão sózinho que lhe doía alma cada vez que pensava no que tinha feito da sua vida.
E um dia, ao receber um email da sua primeira namorada que fazia anos que não via, pôs um disco a tocar do Caetano Veloso, colocou os auscultadores e pensando no silêncio da noite, no seu antes, agora e depois, fechou os olhos e sorriu...e voou para longe, para muito longe...para o pé daquela luz branca que o chamava e que o fazia sentir acompanhado...
Ps- Post dedicado a todas as pessoas que são vitímas de maus tratos, abusos verbais ou fisícos... Nunca deixem de se amar, acreditar e respeitar e tenham sempre coragem para dizer basta e seguirem em frente! A Vida merece ser vivida e não sofrida... Não desistam nunca de lutar por dias melhores. Ás vezes pensamos que isto não acontece a quem conhecemos ou em certos estratos sociais ou a pessoas com grande instrução; mas estamos tão enganados...
Esta estória poderia se passar connosco, com um vizinho, uma amiga, uma filha de um casal conhecido, com um membro da família...Tão perto de nós...
E indago-me, quantas vezes somos abusivos com quem dizemos que mais gostamos???
5 comentários:
Que história deprimente!
É, tantas vezes achamos que os outros é que são felizes e nem suspeitamos o que vai dentro de portas...
Beijos
Podes crer, por isso resolvi escrevê-la...porque achamos sempre que nunca se passa na nossa esfera de relacionamentos.
Beijos
voltaste em grande.
Asdrubal, obrigado pelas tuas palavras!
Um abraço
E o que fazer quando estamos de fora, percebemos o que vai por dentro? Como ajudar os amigos? Sem tomar decisões por eles.... a mim também me custa ver as pessoas deixarem-se ir, porque sim, porque supostamente gostam da pessoa abusiva, porque não têm força própria.... porque o medo de ficar sozinho é maior do que a força de vontade... Espero que se algum dia estiver numa destas situações alguém esteja por perto e me dê um berro poara eu acordar!
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